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Reinvenção Radical

Pensando no público realmente fanático pela banda, U2 deixa de lado os grandes hits e privilegia lados B em turnê

Andy Greene Publicado em 06/07/2018, às 00h04 - Atualizado às 00h14

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<b>Com Horizonte</b><br>
Bono, The Edge, Larry Mullen Jr. e Adam Clayton em 2017

 - Anton Corbijn
<b>Com Horizonte</b><br> Bono, The Edge, Larry Mullen Jr. e Adam Clayton em 2017 - Anton Corbijn

Antes de começar os ensaios para a turnê Experience + Innocence, o U2 tomou uma decisão ousada: o novo show não teria uma faixa sequer de The Joshua Tree, disco clássico do U2 que tem sido a espinha dorsal das performances da banda nas últimas três décadas. O grupo havia passado o ano anterior inteiro tocando na íntegra o álbum de 1987 – que inclui canções como “Where the Streets Have No Name” e “I Still Haven’t Found What I’m Looking For” –, executando o trabalho de ponta a ponta em estádios do mundo todo. “Passamos a régua”, diz o baixista, Adam Clayton. “Se você realmente queria essas músicas, pronto, entregamos. Agora acabou. Estamos seguindo adiante.”

A reinvenção ajudou o U2 a lançar uma das turnês mais radicais que já fez – um passeio cheio de tecnologia pelos cantinhos escondidos do catálogo do grupo, junto a faixas do disco do ano passado, Songs of Experience. “Esta turnê é para os fãs do nosso trabalho mais recente, aqueles mais comprometidos, que realmente ouvem tudo e correm para conhecer os discos novos – e tudo bem ser assim”, diz o guitarrista, The Edge.

O show dá continuidade à turnê de 2015, Innocence + Experience, utilizando o mesmo telão gigantesco que divide as arenas na metade. Mas enquanto a turnê antiga se concentrava no primórdios do U2, com material produzido em meados da década de 1970, em Dublin, a nova é uma jornada mais sombria pelos anos posteriores da vida de Bono. Isso fica claro já na música que abre, “Love Is All We Have Left”. Bono canta a nova faixa sozinho, atravessando a parede de vídeo depois que uma voz ressoa e dispara comandos como “inspire” e “expire” – as instruções são dadas da mesma forma como são ditas a pacientes que estão entrando em uma máquina de exame para fazer ressonância magnética. O momento parece fazer referência ao misterioso “encontro com a própria mortalidade” que ele viveu em 2017 e que, segundo o próprio, inspirou várias letras do novo álbum. É uma largada bem diferente daquela que foi vista no show de 2015, quando a banda tocava um set curto de faixas do início da carreira. “Da última vez nós resolvemos encarnar uma banda punk e fizemos 25 minutos consecutivos de puro rock and roll”, lembra The Edge. “Agora será o oposto disso. É um começo muito parado e meditativo.”

Ao tentar criar uma performance totalmente moderna, a banda encontrou uma nova maneira de se manifestar a respeito do uso de telefones celulares. Em vez de pedir aos fãs que guardem os aparelhos antes do show, como fez Jack White, o U2 está incentivando todo mundo a baixar um app: você aponta o celular para Bono e o aplicativo transforma o vocalista em uma enorme presença fantasmagórica. É a primeira vez que um artista dessa magnitude cria uma experiência de realidade aumentada ao vivo em um show. “Esta é a nossa forma de dizer: ‘Se você vai ficar olhando para o seu telefone, vamos arrumar algo para você ver que faça parte da nossa narrativa’”, diz o diretor criativo de longa data da banda, Willie Williams. “Isso em vez de simplesmente criar um filme que ninguém nunca vai ver.” Curiosamente, o app também gasta sua bateria super-rápido, o que dá uma deixa nem tão sutil assim para deixar o aparelho no bolso durante o resto da noite.

Outros grandes momentos incluem uma versão climática de “City of Blinding Lights” e o retorno do alter ego de Bono, diretamente da época de Zoo TV: o endiabrado Mr. MacPhisto. “Quando você não acredita que eu existo, é aí que faço o meu melhor trabalho”, disse Bono na primeira apresentação, em Tulsa, Oklahoma, no início de maio. Para os mais fanáticos, a maior surpresa tem sido “Acrobat”, de Achtung Baby. A faixa é a única do disco de 1991 que eles nunca tocaram ao vivo. “Ela nunca tinha se encaixado”, argumenta Clayton. “Mas houve um movimento partindo dos fãs-clubes pedindo por ela.” Letras como “Não acredite no que está ouvindo/ Não acredite no que está vendo” parecem novamente relevantes na era Trump. Apesar de nunca ser mencionado nominalmente, o presidente norte-americano é citado de outras formas, inclusive na projeção de imagens de neonazistas marchando em Charlottesville, no ano passado, durante a execução da canção de 1997 “Staring at the Sun”, outra raridade. “É óbvio que vamos nos referir à política do momento”, diz The Edge. “Mas queríamos fazer isso sem ficar dando sermão, essas coisas podem soar um pouco banais.”

O U2 não dá nenhuma confirmação de que pode continuar a turnê em 2019, mas Clayton afirma que é possível que ela seja alongada para incluir outros continentes – além da América do Norte e da Europa, que já fazem parte dos planos.